O avô grande do teatro que sonha com o cinema

"Desde os meus tempos de escola, no município da Samba, entre 1998 e 1999, algumas pessoas  apareciam a elogiar o meu trabalho, que, admito, não era algo sério”, adiantou, acrescentando que muitos insistiam para que procurasse e integrasse um grupo teatral.

"Daí, com aceitação e persistência, aumentei o leque de conhecimentos sobre o assunto”, disse. 

Grupo teatral "Novos Horizontes”

Já em Caxito em 2001, com a criação do grupo teatral "Novos Horizontes” a 10 de Junho do mesmo ano, numa iniciativa de alunos da escola 306, "reapareceu o dom  (...), porque era cómico, o que em linguagem popular significava chalado”, segundo o entrevistado, que admitiu que o projecto inicial do elenco restringia-se a actividades extra-escolares.

Segundo Avô Gongas, há perto de 22 anos, Muginga Júnior, um dos que deram vida ao grupo, entabulou contactos com grupos de Luanda, à busca de apadrinhamento. Com o Oásis conseguiram abertura para sessões de formação, conselhos e apoio moral para a continuação e melhoria da actividade cénica.

Com o apadrinhamento, "o grupo foi subindo de performance” adianta, recordando que "com a idade de crianças” tiveram abertura para palcos nacionais, em Caxito, no espaço Kianda, e no Cine-Teatro Africampos. Faziam teatro de intervenção sócio-comunitária. Daí apareceram mais pessoas para dar alento, como o Alexandre Pedro Afonso, actualmente engenheiro formado na República de Cuba, que trabalhou com o grupo de 2004 a 2009, num período em que o elenco já era semi-profissional. 

Potencial do Bengo

Sobre o potencial do teatro na província do Bengo, Avó Gongas considera-o ao nível do praticado em Luanda.  "Falo do ‘Novos Horizontes’, com participações em festivais nacionais, no Fenacult. Estivemos em todas as províncias do país. Sem medo de errar, de 2001 a esta parte, temos mais de 20 peças escritas. Elas são actualizadas consoante o tempo, porque as realidades alteram-se. Actualmente, temos oito peças preparadas para circulação pelos palcos nacionais”, frisou Avô Gongas.

O actor e encenador confirmou que há cerca de dois meses o grupo esteve em cena nas províncias da Huíla e do Namibe. "Infelizmente não nos deslocamos a Cabinda a 5 de Março. Cancelámos devido a um projecto que o grupo teve no dia 14 de Fevereiro e não foi possível fazer a campanha de marketing apropriada e necessária para o evento em 15 dias. então remarcaremos dentro em breve”.

Avó Gongas reconhece que no passado já houve mais grupos bons, como o "Etu mudyetu”, "Mensageiros de Caxito” e "Caminheiros alegres”, que acabaram por desistir por falta de definição. "Primeiro, os actores vinham de Luanda para cursar o ensino médio e depois de formados retornavam à capital e os grupos desapareciam. Por outro lado, não há salas de teatro no Bengo. O Vissapa faliu. O Cine-Teatro dizem que é privado e a cedência do mesmo é uma luta burocrática. A comida dos actores são os palcos…”

A fonte de inspiração do colectivo, segundo o entrevistado, são as aberturas e lios contactos  que procuram. "Alguns grupos do Bengo são muito parados e acham que o teatro só se faz cá dentro. Precisamos de mostrá-lo fora. Nós fazemos contactos com outros grupos, depois solicitamos espaços nas suas zonas de conforto e seguimos os trâmites legais da realidade, como o pagamento das salas. Houve situações em que gastávamos mais e rendíamos menos. Temos uma experiência do Huambo, em que gastámos muito dinheiro na produção, em papel, em lona, spots radiofónicos e perdemos quase 90 por cento do investimento”.

De acordo com o director artístico, com as constantes perdas em investimentos de vária ordem, preferiram o aprendizado com grupos mais experientes, que mesmo sem casa cheia, conseguem sempre algum. "Eles aconselharam-nos a investir primeiro na imagem do grupo, que deve ser conhecido; depois, na autoridade e competência dos elementos que dirigem; a seguir, nos actores que interpretam os personagens”. Um exercício que, segundo o entrevistado, valeu, porque "hoje temos actores formados do ponto de vista teatral e académico. Pagamos para isto. Chamamos padrinhos como o "Horizonte Njinga Mbandi” e ainda pessoas com formação superior de teatro, para refrescamentos sobre ateliês, preparação de actores, dramaturgia e marketing. Hoje somos felizes e já enchemos as salas”. 

Um grupo e uma família

Quanto à dramaturgia e encenação do "Novos Horizontes”, o homem das artes cénicas confirma que assumiu as responsabilidades pelo grupo em 2009, depois de Alexandre Pedro Afonso. "Actualmente, sou o director artístico. Eu é que escrevo as peças e enceno. Elas retratam de tudo, temos uma estória, fazemos o esqueleto da mesma, escolhemos os actores que participam, a voz (a fala) e montamos os momentos”, explica, dando a conhecer que tem obras que falam do Bengo, a exemplo de "Rastos Encontrados”, que lhes deu o Prémio Provincial, em 2008. A referida peça "retrata a história de Angola, de África e do Mundo, com pinceladas sobre a escravatura, os acordos do Alvor e de Bicesse e as grandes figuras que inspiraram a libertação do país. E ainda o desejo de um país melhor, o fenómeno corrupção… enfim, é uma obra muito rica”, segundo o interlocutor.

O grupo "Novos Horizontes” trabalha como uma família, de tal forma que reúne em si capital humano para vários personagens. "Temos a sorte de termos entre nós juristas, sociólogos, psicólogos, contabilistas, que se encaixam perfeitamente quando no desempenho de um personagem desse calibre”, adianta, sustentando, a título de exemplo, que a peça "Jurisprudência” inclui actores do grupo formados em Direito.

"Hoje só temos apenas um integrante a formar-se no ensino médio. O grosso são técnicos superiores. O colectivo é composto por 10 actores séniores e pessoal de apoio, num total de 15 pessoas. Ainda assim, muitos de nós somos casados, criamos família que entende o nosso trabalho e apoia-nos”, reconheceu Avô Gongas. 

Desafios e testemunho

"A nível do teatro já fizemos quase tudo. O nosso desafio é avançarmos para o cinema”, disse Avô Gongas, informando que estão em contacto  com directores de cinema. 

Quanto à passagem de testemunho para novos fazedores de teatro, o director artístico do "Novos Horizontes” reconhece que é uma grande preocupação, que há receios e algum medo, porque "nós recebemos o testemunho dos mais velhos, ‘os caminheiros alegres’, mas não nos deram o ensinamento como tal. Hoje somos mais velhos, pais e responsáveis. Lamentavelmente, a nível do Bengo, não temos juventude a nascer com veia teatral”, disse, demonstrando preocupação.

O entrevistado garante que o Cefomac, escola de formação em artes no Bengo, é uma instituição amiga, na pessoa do director Tchizaínga, do grupo Miragens, "a quem eu admiro, mas uma parceria de formação de actores nós não temos. Não creio que haja muitos formandos em teatro. Daí deve partir a iniciativa de quem de direito, para incentivar outros elementos a aderirem ao teatro. O  ‘Novos Horizontes’ está a recrutar jovens. Quanto maior é o sangue novo, melhor, porque traz inovação”.

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